Livro: Barba Ensopada de Sangue
30/ago/2013 | | #resenha
Barba Ensopada de Sangue, de Daniel Galera, foi um livro que comprei de presente pro Ivan e eu mesma acabei lendo. Levei uns meses para acabar, lendo cerca de 10 minutos apenas por dia, sempre nos meus trajetos de ônibus. Por coincidência, durante a leitura viajei com minha família para Garopaba. Foi uma bela surpresa, assim como ler Na pior em Paris e Londres quando fui para Paris em 2008!
Para quem se assustou com o título, respire fundo e continue lendo: não se trata de uma história de terror. A história deste livro se dá através dá busca pela identidade, mais precisamente no passado da família do personagem. Existem lendas, lembranças e assuntos inacabados que o levam a mudar de cidade em busca de informações sobre seu avô, morto em Garopaba. Chegando lá somente acompanhado da cadela de seu pai (que se suicidou), ele é surpreendido por uma pequena cidade que fica ainda mais vazia e morta no inverno. O que vemos então é a própria investigação, acompanhada de toda adaptação na nova cidade e uma incrível vontade de se isolar do mundo. Aliados aos trechos sobre a história, há diversos trechos mais soltos e reflexivos, que mexem conosco de forma sensível. Um exemplo disso são textos sobre a própria cidade, a vida, as pessoas, o budismo e até os animais (pus dois no fim deste post).
Este é um livro de que se fica íntimo aos poucos, enquanto você vai acompanhando o dia-a-dia do personagem e suas relações vazias. Este personagem por sua vez não é um herói, e sim uma pessoa comum, o que deixa a narrativa ao mesmo tempo interessante e detalhada. Falando nisso, queria destacar a escrita incrível de Galera, que não escreve de um jeito comum. Ele tem um estilo bem solto e ao mesmo tempo descritivo, que nos faz querer sempre ler mais e mais. Enfim, uma escrita agradável e sem frufru.
Indico este livro pra ser lido lentamente e diariamente, assim como o passar dos dias do personagem. Deixo aqui dois trechos maravilhosos deste livro para vocês verem a maneira como Galera escreve.
“Tu pode deixar pra trás um filho, um irmão, um pai, com certeza uma mulher, há circunstâncias em que tudo isso é justificável, mas não tem o direito de deixar pra trás um cachorro depois de cuidar dele por um certo tempo, disse‑lhe uma vez quando ainda era criança (…). Os cachorros abdicam pra sempre de parte do instinto pra viver com as pessoas e nunca mais podem recuperá‑lo por completo. Um cachorro fiel é um animal aleijado. É um pacto que não pode ser desfeito por nós. O cachorro pode desfazê‑lo, embora seja raro. Mas o homem não tem esse direito, dizia o pai.”
“Os bebês precisam aprender a respirar fora d’água. Porque a coisa mais maluca é que isso não é um peixe, é um mamífero. (…) Já viu como é o esqueleto de baleia? Elas têm ossos como patas nas nadadeiras. Mãos e dedos. Fico pensando se esse hábito de migrar pra cá e ficar na beira da praia não tem a ver com uma nostalgia do passado. Da ancestralidade terrestre. Imaginava uma baleia ali no rasinho, quase na praia. O que será que ela sente? Pode ser que veja a fronteira de um outro mundo remoto e mortífero, tão ameaçador quanto o mar é pra gente. Mas pode ser que seja como voltar pra casa. ”
Barba Ensopada de Sangue
Daniel Galera
Companhia das Letras
424 Páginas
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