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Capitães da Areia, Jorge Amado


18/mar/2014 | Anielle Casagrande | # #

Foto: minha mãe na Praia do Forte / BA

Foto por minha mãe na Praia do Forte / BA

“Mas o carrossel girava com as crianças bem vestidas e aos poucos os olhos dos Capitães da Areia se voltaram para ele e estavam cheios de desejos de andar nos cavalos, de girar com as luzes. Eram crianças, sim – pensou o padre.”

Este é meu livro favorito há muitos anos. Como já contei antes, já tive uma queda por Nelson, Orwell, Huxley etc. Eu já havia lido alguns livros de Jorge Amado na infância, mas quando descobri Capitães da Areia meu jeito de olhar a literatura nacional mudou. Comecei a ler tudo que achava na frente e fosse brasileiro. Mesmo flertando com outros autores, Jorge continua tendo um espacinho todo especial no meu coração <3.

O livro que mais gostei dele foi Capitães da Areia. Talvez pelo momento em que li e tudo que pensei naqueles dias. Acho que para os que nunca leram nada de Jorge, este livro é o perfeito para iniciar. Ele é curtinho e é dividido em pequenas histórias, ou seja, você pode ler apenas algumas páginas e dar uma pausa sem se perder.

Como muitos já sabem, este livro é responsável por plantar uma sementinha de compaixão nos corações brasileiros (por alguns chamada de comunismo!). De maneira nada discreta, Jorge vai nos contando a história de alguns jovens delinquentes baianos. De cara, você fica sabendo de alguns delitos como pequenos assaltos, para depois finalmente ser apresentado a este bando. São meninos de rua que foram morar em um trapiche abandonado, por isso o nome Capitães da Areia.

O que parece estranho vai ganhando moldes incríveis nas mãos de Jorge. Ele realmente sabe como me surpreender. Além de serem totalmente malandros, os meninos ainda respondem com rebeldia e agressividade a tudo que a sociedade lhes impõe. São tratados com medo, crueldade e indiferença por todos, e é assim que agem em retorno. Torturados, perseguidos e esfomeados, acabam se isolando e criando sua própria sociedade no trapiche, com seus líderes e regras próprias. Tudo isso machuca um bocado, quando lendo percebemos que trata-se de crianças extremamente carentes de tudo e que não tem como sair deste meio.

Olhando mais de perto vemos que apesar de marginalizados, perigosos e até maldosos, estes meninos também têm sonhos e diferentes personalidades. Um é muito religioso e quer ser padre. Outro gosta de ler, lendo sempre para os demais. Outro sonha em ser cangaceiro. Outro está envolvido com prostitutas. Há ainda os que tornaram-se tão cruéis que desejam apenas se vingar.

No meio disso tudo, há MUITAS passagens incríveis. Quando percebemos a real fragilidade e carência destas crianças não tem como não se emocionar. Por exemplo quando o menino manco consegue ser “adotado” por uma família apenas com objetivo de observar onde estão os bens preciosos, já planejando um futuro roubo. Ao mesmo tempo que ele está apenas seguindo o plano bolado pelo grupo, ele acaba gostando de ter uma cama para dormir, uma família, uma casa, algumas roupas. Os demais acabam tirando sarro dele quando passa a ser tratado como uma criança pelos novos pais. Enquanto deve fidelidade ao grupo, o menino chega até a se questionar sobre o que está prestes a fazer para aquela família. Neste ponto vemos que sua vida já está tomada por tanta amargura, que sequer pensar em poupá-los já lhe causa revolta.

Talvez a passagem mais maravilhosa seja quando os meninos brincam em um carrossel velho e desbotado que chega à cidade. Dois deles conseguem um ‘emprego’ cuidando do brinquedo e assim conseguem levar todo o bando para uma volta de madrugada. Mesmo não tendo direito a infância e a ser crianças, neste momento vemos que estes meninos não são monstros e sim pobres crianças desamparadas. Os mesmos meninos que sofrem e fazem sofrer, agora estão brincando e se divertindo como verdadeiras crianças que são, em um carrossel desbotado.

“Depois vai o Sem-Pernas. Vai calado, uma estranha comoção o possui. Vai como um crente para uma missa, um amante para o seio da mulher amada, um suicida para a morte. Vai pálido e coxeia. Monta um cavalo azul que tem estrelas pintadas no lombo de madeira. Os lábios estão apertados, seus ouvidos não ouvem a música da pianola. Só vê as luzes que giram com ele e prende em si a certeza de que está num carrossel, girando num cavalo como todos aqueles meninos que têm pai e mãe, e uma casa e quem os beije e quem os ame. Pensa que é um deles e fecha os olhos para guardar melhor esta certeza. Já não vê os soldados que o surraram, o homem de colete que ria. O Sem-Pernas vai teso no seu cavalo. É como se corresse sobre o mar para as estrelas na mais maravilhosa viagem do mundo. Uma viagem como o Professor nunca leu nem inventou. Seu coração bate tanto, tanto, que ele o aperta com a mão.” (página 62)

Para fechar, queria citar que há ainda a chegada de Dora na história, que é a primeira menina a entrar para o bando. De início todos desejam abusar dela, mas logo acabam vendo-a como uma figura materna. Há ainda dois meninos que se apaixonam por ela, deixando o livro ainda mais emocionante. Para a maioria dos fãs está é a melhor parte do livro.

Dica: não recomendo o filme baseado no livro, por não representar nem um décimo da profundidade desta obra.

Recomendo a leitura deste livro para todos. É um livro maravilhoso e emocionante. Compre aqui.

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