Uma mamãe muito comilona

Estávamos lendo o livro da lagarta comilona antes de dormir, quando resolvi tirar um sarro e disse que a lagarta comeu muito e passou mal depois, exatamente igual a mamãe. Meu filho riu. Depois apareceu a lagarta bem gorda, escrito “lagarta gorducha” e falei que também era igual a mamãe. Ele ficou indignado: “Mas a mamãe não é gorducha assim”. Realmente. No desenho a lagarta está enorme, redonda, quase explodindo. Com certeza ele olhou para mim (e poderia olhar para qualquer outra pessoa) e não consegui ver relação alguma com aquele desenho. 

Pedi desculpas, dei minha melhor risada sem graça e aproveitei para me explicar. “A mamãe não é gorducha, você tem razão. A mamãe só fez uma brincadeira boba porque a mamãe adora comer muito, igual a lagarta.” Acho importante também nessas conversas já começar a explicar para as crianças que não é legal chamar os outros de gordo, ou de feio, enfim, comentar a aparência alheia. Também acho importante não ficar reclamando da minha aparência na frente dele, para ele não crescer ouvindo que um corpo como o meu tem algo de errado ou feio. 

Sinto que se eu tivesse respondido algo sobre minha aparência “gorducha”, ele poderia naturalizar sair olhando pessoas na rua e chamando de “gorducha” ou algo do tipo. Também tem as questões pessoais de cada um. Tem gente que está feliz como está, saudável, ou mesmo gente que já sente uma culpa enorme pela sua aparência. Não acho certo ensinar crianças a ficar julgando. 

Lá no fundo, também me preocupa que ele desenvolva uma maneira “viciada” de olhar para si mesmo e para mulheres quando for mais velho, perpetuando uma ideia de que apenas o corpo magro e torneado é bonito, que barriga precisa ser chapada, peito precisa ser firme etc. Na vida real poucas pessoas são assim. Inclusive, muita gente está bem longe de ser assim e está feliz como é. É esta a mensagem que eu pretendo passar para ele no dia a dia, e torcer para que ele seja uma dessas pessoas felizes também.